Mais de 100 particulares foram empurrados para o “banco mau” pelo BdP. Pedem às autoridades para aderir à proposta de troca de obrigações
in: Dinheiro Vivo, 16 agosto 2017
O conjunto de 111 investidores particulares que viram os seus investimentos empurrados para o “banco mau” pelo Banco de Portugal (BdP) um ano e meio após a resolução do BES vão contactar o banco central esta semana para solicitar a sua inclusão na lista de obrigações que o Novo Banco quer recomprar com desconto. Em contrapartida a este desconto, o Novo Banco propõe o acesso a um depósito a prazo especial, cuja remuneração pode chegar aos 6,5%.
“Vamos enviar esta semana uma carta formal ao Banco de Portugal a solicitar que nos dêem acesso à mesma solução oferecida aos detentores das linhas de obrigações seniores que ficaram no Novo Banco, e que inclui o acesso a um depósito a prazo”, revelou Ruy Ribeiro, presidente da Associação de Obrigacionistas Sénior Particulares Lesados do Novo Banco (AOSPNB), ao Dinheiro Vivo.
A carta será dirigida a Carlos Costa, governador do BdP, mas será igualmente enviada ao cuidado dos grupos parlamentares e à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
“Procuramos ter um tratamento igual ao que foi dado aos restantes obrigacionistas, que irão recuperar já 70% a 80% do valor investido e, a médio-prazo, através da remuneração prevista no depósito a prazo oferecido pelo Novo Banco, elevar essa recuperação para a casa dos 90% a 100%”, explicou Ruy Ribeiro. Caso não sejam integrados nesta solução, estes 111 particulares que investiram 19,2 milhões de euros no Novo Banco vão perder a totalidade do seu investimento.
“Ainda que as cinco séries de obrigações seniores transferidas pelo BdP do Novo Banco para o BES tenham sido preferencialmente compradas pela Pimco e Blackrock, estes revenderam-nas no mercado secundário e foi o próprio Novo Banco, já depois de agosto de 2014, que as vendeu a clientes através dos balcões, dizendo que como o banco já estava nas mãos do Banco dePortugal, o investimento era seguro e garantido”, explicou o mesmo responsável.
O presidente da AOSPNB explicou ao DV que os 111 lesados pelo Banco de Portugal sentem-se discriminados pelo supervisor, precisamente quem devia ser o seu garante, pois este era já responsável pela gestão do Novo Banco quando os trabalhadores da instituição começaram a vender estas obrigações.
“Além disso, o Banco de Portugal escolheu a dedo quais as obrigações que iam ser transferidas para o ‘banco mau’”, acusa Ruy Ribeiro. “Só escolheram séries onde os casos de litígio são resolvidos em Portugal. O BdP conhece a justiça portuguesa e sabe que as ações nos tribunais deverão demorar uns 5/6 anos a ser decididas, e depois outros tantos tanto no Tribunal de 2ª Instância como no Supremo, ou seja, o supervisor tem a garantia que os processos podem demorar pelo menos 15 anos.”
Já as restantes obrigações seniores sobre as quais o BdP optou por não mudar as regras depois do jogo concluído – leia-se transferi-las para o buraco do BES meses depois da resolução –, não por acaso são as que prevêem que eventuais litígios sejam resolvidos na Justiça Inglesa, bastante mais célere como ficou evidente no recente caso dos ‘swaps’ das empresas de transportes públicos.
Origem dos lesados do BdP
Foi a 29 de dezembro de 2015 que Carlos Costa decidiu alterar o perímetro da resolução decretada quase um ano e meio antes, transmitindo a responsabilidade sobre cinco séries de obrigações séniores específicas do Novo Banco para o BES – com um valor nominal de 1985 milhões de euros.
Na altura, o supervisor garantiu que a decisão apenas afetava investidores institucionais – normalmente grandes fundos de investimento, como as referidas BlackRock ou PIMCO. Contudo, e com o passar do tempo, descobriu-se que mais de uma centena de particulares foram também lesados pela opção de Carlos Costa, já que nos meses que passaram entre a resolução e a transmissão, o próprio Novo Banco andou a vender estas obrigações aos balcões, exigindo um investimento mínimo de 100 mil euros.
Tratando-se de apenas 111 investidores, um número de lesados bem menos expressivo que noutros casos similares – lesados do BES, lesados do Banif ou emigrantes lesados –, estes investidores apontam não ter capacidade para organizar grandes manifestações, como aquelas que, mesmo ganhando contornos violentos, ou talvez até por isso, acabaram por obrigar as autoridades a dar ouvidos aos restantes lesados pelas resoluções bancárias decididas da noite para o dia.