Finanças: Revisão de juros permitirá “neutralizar” eventuais impactos negativos
in: Dinheiro Vivo, 7 abril 2017
A possibilidade de rever a cada cinco anos a taxa de juro cobrada ao Fundo de Resolução, alinhando-a com o custo de financiamento da República, dará ao Estado a possibilidade de “neutralizar o impacto para os contribuintes” de eventuais perdas oriundas da diferença entre o custo de endividamento do Estado e o preço cobrado à banca pelos empréstimos ao Fundo, avançou o Ministério das Finanças ao Dinheiro Vivo. Em causa estão os 3,9 mil milhões emprestados para a resolução do Banco Espírito Santo (BES) e os 489 milhões para o madeirense Banif.
O juro que hoje o Estado cobra ao Fundo de Resolução – que é financiado por contribuições dos bancos -, é de 2% no caso do BES e de 1,38% no caso do Banif, depois de a recente renegociação dos termos destes empréstimos, que visaram tanto o juro como a maturidade, ter fixado a vigência destas taxas até 2021 no caso do BES, e 2020 no caso do Banif – e alargar o prazo de reembolso de ambos até 2046.
Com estas alterações, e ao contrário do que acontecia até aqui, o Estado terá deixado de lucrar com os empréstimos para resgatar bancos – este era o cenário tanto no caso do Fundo de Resolução antes das renegociações, como no caso dos CoCos.
E esta mudança, assumida em prol da estabilização do setor financeiro e até em prol dos chineses da Fosun – a previsibilidade dos pagamentos futuros ao Fundo de Resolução foi uma das exigências deste grupo para avançar para a aquisição de uma fatia do BCP -, está a levantar polémica no Parlamento. Os partidos da oposição deverão aprovar para a semana um pedido à Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) para fazer as contas ao custo das renegociações e se estas irão resultar em perdas.
Neutralizar impacto
Questionado sobre o custo líquido deste aligeirar de condições, a tutela referiu ao DV que o “juro cobrado tem por base o custo de financiamento da República Portuguesa”. E detalhou: “Este custo é observado pela taxa de juro implícita nas obrigações do Tesouro com prazo de 5 anos e revista todos os 5 anos.” É esta revisão ao juro cobrado a cada cinco anos, e da sua equiparação ao custo da dívida pública a 5 anos, que permitirá compensar eventuais perdas. “Desta maneira, tenta-se neutralizar o impacto para os contribuintes”, explicou o ministério.
Além do nivelamento dos juros cobrados a uma taxa de juro nominal anual que reflita o custo de financiamento da República para um prazo de cinco anos, a renegociação dos dois empréstimos que acontecerá em 2021 e 2020 prevê igualmente que o novo juro seja ainda acrescido de mais 0,15% a título de “comissão base”.
Contudo, e independentemente das taxas que forem sendo fixadas, os pagamentos anuais do Fundo estarão sempre limitados nos próximos anos ao objetivo de manter os pagamentos dos bancos estabilizados em torno de 250 milhões de euros, pelo que se o juro subir, o prazo do reembolso deverá ser ainda mais dilatado – provavelmente reduzindo o valor amortizado anualmente mas não o juro.
FR já pagou 275 milhões em juros
Um outro fator a ter em conta nos cálculos ao impacto das renegociações é o ganho que o Estado já terá conseguido com os empréstimos ao Fundo de Resolução até os termos dos mesmos terem sido renegociados.
O juro cobrado inicialmente foi de 2,926%, subindo posteriormente para 3,092% e depois até 3,127%. Estes valores fizeram que, até ao final de 2016, o Fundo de Resolução já tivesse pago em juros e comissões 275 milhões de euros ao Estado, tendo ainda reduzido a dívida relacionada com o Banif para 353 milhões, depois de um reembolso antecipado de 136 milhões de euros.
Todos estes valores terão gerado margens positivas para as contas públicas que, contudo, se desconhecem – mas que podem ser tidas em conta no cálculo ao saldo global aos fluxos financeiros totais destes empréstimos.
Comparações possíveis
Além das contas ao passado e das previsões sobre juros futuros, há ainda que olhar para o hoje. E aqui são várias as referências com que os juros cobrados nos empréstimos ao Fundo de Resolução podem ser comparados, sendo apenas certo que os 1,38% do Banif ficam aquém.
Por um lado, podemos comparar o preço de 2% e 1,38% cobrado ao Fundo de Resolução pelo BES e Banif, respetivamente, com os 2,7% da última emissão do Estado a cinco anos, realizada em fevereiro. Todavia, e nas duas emissões anteriores com o mesmo prazo, estas já foram fechadas a 2,1% e 1,75%, respetivamente – em linha e abaixo dos 2% cobrados pelo BES.
Mas quando se fala em juros da dívida fala-se sobretudo dos juros no mercado secundário – negociações entre investidores. Ontem, os títulos portugueses a cinco anos apresentavam juros de 2,2%, mas nos últimos doze meses variaram entre 1,5% e 2,4%. Em alternativa, também se pode olhar para as médias anuais destes mesmos títulos a 5 anos – que foram de 2,5% em 2014; 1,25% em 2015 e 1,85% em 2016, segundo dados do Banco de Portugal.