Notícia da TVI precipitou tudo e obrigou decisão “em cima do joelho”

Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, explicou ontem o porquê de a resolução do Banif ter sido decidida em 24 horas

in: Dinheiro Vivo, 6 abril 2016

A suspensão do estatuto de contraparte do Banif não foi, afinal, determinante no acelerar do colapso do banco madeirense. O que tornou urgente resolver o banco em meia dúzia de horas de sábado para domingo foi a falta de liquidez em que o Banif caiu na semana anterior, depois de 960 milhões de euros em depósitos terem fugido da instituição na sequência da notícia da TVI de 13 de dezembro – que admitia o fecho iminente do banco e a sua integração na CGD, com perdas para alguns dos clientes.

Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, trouxe ontem uma nova luz sobre a urgência repentina em tomar a decisão de resolução que entregou os ativos do banco ao Santander Totta. O responsável esteve na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ao processo que levou à resolução do Banif e descreveu aos deputados a sequência dos eventos, permitindo perceber o porquê de tudo ter sido decidido “em cima do joelho”, de 19 para 20 de dezembro.

Efeito TVI

O impacto da notícia da TVI, amplamente abordado pelos antigos gestores do banco ao longo das audições na semana passada, voltou ontem à baila na audição do governador do Banco de Portugal. Carlos Costa explicou que a decisão de suspender no dia 21 de dezembro o estatuto de contraparte – o que permite a um banco recorrer a financiamento do Eurossistema – foi tomada a 16 de dezembro numa reunião do Conselho de Governadores do BCE ironicamente presidida por Vítor Constâncio. Contudo, esta decisão “não foi determinante na resolução”, garantiu. Foi antes a situação de falta de liquidez do banco. Na sequência da notícia da TVI, surgiu uma corrida aos depósitos, que em poucos dias retiraram 960 milhões do banco, já com dificuldades em termos de cumprimento de rácios. Perante esta fuga de depósitos, o Banif recorreu à linha de liquidez de emergência disponibilizada pelo Banco de Portugal, única forma de conseguir devolver as verbas que os clientes queriam tirar do banco.

O fim do colateral

Foi este recurso precoce à linha de emergência provocada pela notícia que acabou por tornar urgente uma solução para o Banif, decisão essa tomada de sábado para domingo, de 19 para 20 de dezembro. Se o Banif abrisse na segunda-feira, dia 21, explicou o governador, “o banco só tinha 125 milhões de euros disponíveis para colateral”, ou seja, para dar como garantia e continuar a aceder à emergência de liquidez. A partir daí, ficava completamente a zeros e sem capacidade de responder aos seus clientes.

Caso esta falta de liquidez não se verificasse, e mesmo com suspensão do estatuto de contraparte, o Banif poderia ter operado normalmente sem ser urgente fechar o banco e entregar os seus ativos ao Totta. Ainda neste ponto, Carlos Costa lembrou que a resolução tornar-se-ia inevitável, mas mais tarde, quando as autoridades europeias considerassem a injeção pública de 2012 ilegal, o que colocaria os rácios de capital do banco abaixo dos mínimos legais e, aí sim, ficaria de vez sem acesso a liquidez. Mas tal situação não obrigaria a uma decisão da noite para o dia.

“Na segunda-feira teriam apenas 125 milhões para colateral disponível, logo iriam ter restrições no acesso à liquidez, um problema insuperável”, explicou Carlos Costa. “Tinha de se resolver a questão sob pena de criar instabilidade financeira.”

Urgência tirou 1,6 mil milhões

Carlos Costa admitiu ainda que a urgência na resolução implicou perdas para o Estado com o negócio. Houve uma “desvalorização atribuída à atividade do Banif pelo adquirente”, o Santander Totta, culpa da “circunstância da venda rápida e das faltas de alternativa” quando se decidiu pela resolução de um dia para o outro.

A desvalorização atingiu os 1,6 mil milhões de euros, um valor que incluiu 1,1 mil milhões para cobertura de riscos e custos de reestruturação associados aos ativos do Banif e mais 650 milhões impostos como desconto para “exigências para o reequilíbrio do balanço do banco”, valor a que se devem retirar 150 milhões de euros – o preço “pago” pelo Santander Totta.

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