Banca mundial dividida entre o caos e a ordem em 2016
De um lado, JPMorgan, Société Générale e Royal Bank of Scotland (RBS). Do outro, Bank of America, Goldman Sachs ou Citibank. Se os primeiros antecipam um ano de caos, os segundos defendem o oposto. Mas o alarme dos primeiros supera em mediatismo as previsões otimistas dos segundos.
“Tal como alertámos, este ano parece-se cada vez mais com 2008”, aponta uma análise do RBS de 8 de janeiro que ontem foi amplamente noticiada pelo tom surpreendente: “Vendam tudo!”, “Os investidores devem ter medo”, este vai ser “um ano de cataclismo”.
A ajudar o RBS veio o Société Générale (SG), que ontem disse prever uma queda de até 75% das bolsas norte-americanas. As duas instituições coincidiram também nas causas do cataclismo:a queda do petróleo, a desaceleração na China e a consequente diminuição do comércio internacional. Como não há dois sem três, o JPMorgan foi outro dos gigantes da banca que já recomendou aos seus clientes que fujam das bolsas.
Do outro lado da barricada encontram-se Bank of America, Goldman Sachs e Citigroup, que olham para as correções nos mercados registadas no início do ano como movimentos exagerados, chegando até a prever alguns ganhos nos principais índices mundiais durante 2016 – de 10% a 20%.
Alarmista ou visionário?
“Exagerado e catastrofista”, foi como Agostinho Leal Alves, analista financeiro do BPI, rotulou a análise do Royal Bank of Scotland, em declarações ao DN/Dinheiro Vivo. “Um relatório dessa ordem é alarmista de mais, o que é mau, porque os mercados funcionam muito por antecipação, por sentimento.”
O analista admite que 2016 seja um ano de correcções nos mercados, especialmente nas bolsas americanas, mas vê nesses ajustamentos um passo necessário para a recuperação: “Os índices norte-americanos atingiram máximos no ano passado. Será normal que ajustem este ano, um ajustamento para consolidar a tendência de subida.”
Pedro Ricardo Santos, gestor da XTB, apesar de reconhecer que “os mercados andarão a reboque da China” em 2016 e que a economia do país está em queda, lembra que ela é relativa – de 10% para 7% – e não nos “devemos centrar em detalhes quando a fotografia revela bons dados”.
Sobre a posição oposta dos bancos, atribui esses “extremos” ao facto das previsões de cada banco resultarem “da importância maior ou menor atribuída a cada um dos indicadores que nos chegam”. Mesmo que se registem quedas, aponta, estas serão o desbloqueador “para que a recuperação se inicie”.
Mas nem todos olham para as análises do RBS ou do SG como excessivamente pessimistas: “Desde julho que tenho aconselhado uma exposição a ações baixa”, revelou ontem João Ermida, ex-Santander e hoje conselheiro financeiro de famílias na Golden Assets. Ermida acredita que os alertas do RBS vão “no caminho certo”, salientando ser “possível que o banco esteja a ver e a afirmar publicamente o que outros ainda não viram”. Este ano será “de elevado risco”, antecipa.
Além do tom escolhido pelo RBS, há também a questão do prazo da análise: apenas um ano. Rui Bárbara, gestor de ativos do Banco Carregosa, confessa que não atribui “muito significado a previsões com este horizonte”, até porque “no espaço de um ano há muitos fatores aleatórios que influenciam os mercados”. O gestor foca-se antes na divulgação alargada da análise.
“O que me surpreende e me parece contraproducente é o ‘research’ ser divulgado junto do grande público.” Rui Bárbara explicou que é no grande público que estão os investidores “particulares, de classe média”, cujas carteiras apostam no equilíbrio e em prazos mínimos de cinco anos. “Estes conselhos a tão curto prazo são úteis apenas para os profissionais que estão sempre a entrar e a sair do mercado”, daí não perceber o porquê da divulgação alargada da análise.
Impacto em Portugal
Mesmo que os tons alarmistas contagiem os mercados, a dívida portuguesa pode ficar a salvo. Mesmo não estando entre os principais ativos-refúgio recomendados pelo RBS – “as obrigações de elevada qualidade” –, certo é que os economistas do banco não deixam de recomendar as dívidas dos periféricos como potencial ponto de escape, sobretudo porque estas apresentam maiores rentabilidades que a dívida alemã, por exemplo, e porque a torneira do BCE continuará ativa ao longo de 2016 e início de 2017.
in: Dinheiro Vivo, DN, 14 janeiro 2016