Narrativa de culpar Constitucional por novo resgate cai por terra com análise da troika à sustentabilidade da dívida portuguesa. Relatório sobre aumento dos prazos alerta para as exageradas necessidades de financiamento de Portugal a partir de 2014, que não só surgem em pior enquadramento económico, como serão bem mais elevadas que no período pré-troika: cerca de 20 mil milhões de euros por ano
Tal como está desenhado actualmente, o resgate de 78 mil milhões de euros recebido por Portugal vai obrigar a um segundo resgate dentro de pouco tempo, já que as necessidades de financiamento de Lisboa depois do fim do programa de ajustamento serão maiores que aquelas anteriores à chegada da troika e num enquadramento mais agressivo. O alerta vem da própria troika e do fundo europeu no relatório sobre a eventualidade da extensão dos prazos dos empréstimos que, todavia, não aborda a questão do segundo resgate directamente. Apenas diz que será difícil encontrar investidores interessados num país com um ‘rating’ mau e necessidades de financiamento demasiado elevadas.
Segundo o levantamento feito no relatório [ver em baixo], disponibilizado pelo Financial Times, as exigências de financiamento com que Portugal será confrontado a partir de 2014 serão quase impossíveis de satisfazer a níveis razoáveis de juros. O Portugal foi aos mercados buscar anualmente 10 a 12 mil milhões de euros nos anos anteriores à crise, refere, “um valor que dificilmente conseguirá superar no período imediatamente a seguir ao fim do programa”.
“Apesar das necessidades de financiamento portuguesas serem baixas em relação ao Universo potencial de investidores, elas são enormes em comparação com os países-referencia. Portugal tem o desafio de precisar de mais financiamento do que antes da crise, tendo agora um ‘rating’ de sub-investimento.” Assim, o relatório conclui que “há riscos de financiamento substanciais para Portugal, dado que ainda está sujeito a várias vulnerabilidades no final do programa”, salientando também que entre 2015 e 2020 as amortizações de dívida portuguesa “vão bem acima do limiar dos 12/15 mil milhões de euros anuais” do período pré-crise.
Segundo o relatório, entre os défices das contas públicas nos próximos anos e as necessidades de amortização de dívida, Portugal irá ter necessidades de financiamento anuais de 20 mil milhões de euros entre 2015 e 2021, valor portanto bem acima do limitar dos 12/15 mil milhões salientado anteriormente. “A tarefa de emitir dívida a médio e longo prazo acima do valor que já é actualmente detido pelos participantes no mercado [não só as amortizações mas também a nova dívida] poderá ser muito exigente sem uma melhoria no ‘rating’ de Portugal e a criação de uma base estável de investidores”.
A referência à base estável de investidores surge porque nos leilões de dívida que Portugal continuou a fazer no último ano e meio o perfil dos investidores continua longe do normal, diz a troika. “Uma anormal percentagem da emissão foi comprada por especuladores, como os fundos de investimento (25%) ou gestores de activos, com uma percentagem muito baixa de investidores mais estáveis, como bancos centrais e outras instituições oficiais. Em contraste, investidores como institucionais do sector privado (…) continuam muito ausentes. Como resultado, o baixo ‘rating’ e a base de investidores muito voláteis podem limitar tanto o tamanho como a maturidade do potencial de emissões de obrigações pelo Estado.” O relatório salienta ainda sobre este ponto que tanto em Outubro de 2012 como em Janeiro deste ano, as idas de Portugal ao mercado “tiveram uma boa procura, mas a base de investidores foi dominada” pelos referidos especuladores “ao invés dos grandes investidores tradicionais em que sempre se basearam as emissões portuguesas”. Assim, “e neste momento, o acesso de Portugal ao mercado só pode ser considerado como limitado”.
A tudo isto juntam-se outros dois factores: “Há ainda o risco das condições macroeconómicas adversas ou de novas dificuldades com o Sector Empresarial do Estado aumentarem ainda mais as necessidades de financiamento do país, suspendendo por completo o acesso ao mercado”, lê-se no relatório.
Grande parte das necessidades de financiamento de Portugal nos próximos anos [2014-2020] está associada aos reembolsos dos empréstimos da troika, que Portugal começa a reembolsar já a partir do próximo ano. Assim, levanta-se a questão: o prolongamento dos prazos melhoram o complicado cenário de financiamento previsto para o país nos próximos anos? “Aumentando a maturidade dos empréstimos” da troika “melhora-se o perfil anual de amortizações, reduzindo a pressão sobre as emissões de dívida”. Além disso, refere a troika no estudo, “a extensão dos prazos dará um forte sinal de confiança (…) que teria um impacto positivo não apenas nos mercados mas também no apoio popular dos programas de ajustamento”.
in: Ionline, 11 Abril 2013