Se no ano passado foram descativados em média 13 milhões por cada mês de janeiro a agosto, ao longo deste ano a média está nos 89 milhões
in: Dinheiro Vivo, 10 setembro 2017
Até ao final de agosto, o governo descativou 710 milhões de euros em despesa, valor que compara com a libertação de 103 milhões de euros permitida nos primeiros oito meses de 2016. Contas feitas, e se no ano passado foram descativados em média 13 milhões por cada mês de janeiro a agosto, ao longo deste ano a média está nos 89 milhões, quase sete vezes mais.
As contas públicas começaram o corrente ano com mais 8,6% de cativações face ao início de 2016, mas o garrote tem sido aliviado de forma mais célere. Se em agosto de 2016 ainda existiam 1,63 mil milhões cativados dos 1,73 mil milhões de euros iniciais, em agosto deste ano as cativações ainda “em vigor” não atingiam os 1200 milhões de euros.
Será mesmo? O futuro o dirá
Olhando para a frente, porém, será ainda preciso confirmar se as descativações persistem a este ritmo até ao final do ano, pois pode tratar-se apenas de uma mera alteração de perfil ou de calendário das mesmas ao longo deste ano.
Se é certo que entre janeiro e agosto de 2016 as descativações foram de 103 milhões, nos restantes meses o cenário foi bem distinto: entre setembro e dezembro do ano passado foram descativados mais 686 milhões de euros, elevando o total de descativações naquele ano para os 803,6 milhões. Assim, e do total descativado em 2016, apenas 13% foi entre janeiro e agosto.
A conclusão resulta do cruzamento dos valores divulgados pelas Finanças na última semana relativos a janeiro e a agosto de 2016 e 2017, e os valores presentes na Conta Geral do Estado de 2016, que mostram o total de descativações nesse ano. Destaque-se, porém, a posição das Finanças presente nos dados divulgados, em que salienta que “no segundo semestre o valor dos cativos tende a ser substancialmente reduzido”, indiciando uma aceleração nas descativações até ao fim do corrente ano.
Analisando os dados por agrupamento económico, nota-se que o valor ainda cativo na maioria das rubricas persiste acima dos valores do final de 2016, à exceção das verbas para “juros e outros encargos”, que no ano passado pouco ou nada foram alteradas, enquanto até agosto deste ano viram quatro milhões libertados. Uma outra exceção encontra-se nas “aquisições de bens de capital”. Se entre janeiro e agosto de 2017 as cativações neste agrupamento foram reduzidas até 41 milhões de euros, este é o mesmo valor com que fecharam 2016 – 41,1 milhões.
A dimensão do alívio ao garrote é também outro aspeto a ter em atenção: nas “despesas com pessoal”, por exemplo, o valor que o governo já libertou neste ano está pouco abaixo do valor libertado em todo o ano passado, de 84,2 milhões, contra os 80 milhões já descativados neste ano. Haverá margem para libertar mais? Os próximos meses o dirão. Um detalhe, porém: neste ano o governo cativou mais 37,4% de verbas nas “despesas com pessoal” do que no ano passado – 176,1 milhões contra os 242 milhões deste ano.
Alterações legais
Os números divulgados na última semana pelo governo serviram de mote para os partidos da oposição avançarem com as propostas em que têm vindo a trabalhar a propósito das cativações. O Bloco de Esquerda anunciou nesta sexta-feira uma iniciativa para obrigar todo e qualquer governo a divulgar periodicamente os níveis de cativações existentes, procurando deste modo promover a transparência das mesmas. Os bloquistas pretendem que as cativações sejam feitas através “da lei do Orçamento do Estado e não através de qualquer outro mecanismo legal”.
Também o CDS, em agosto, anunciou desejar promover uma alteração à lei de enquadramento orçamental, de modo a que as sínteses de execução orçamental da responsabilidade da Direção-Geral do Orçamento passem a divulgar mensalmente o valor e a evolução das cativações.
Ricardo Reis, professor de Economia na London School of Economics, questionado sobre as iniciativas dos partidos, apontou ao DN/Dinheiro Vivo que é de saudar o aumento da transparência no que toca às cativações. Sobre a proposta que o BE quer apresentar, o académico salientou que esta “aumenta a transparência da execução orçamental, algo positivo”.
Quanto ao recurso a cativações por parte do atual governo, Ricardo Reis não identifica qualquer abuso ou exagero, antes pelo contrário. “O ministro não abusou. Antes as usou legitimamente, de uma maneira muito hábil, para conseguir uma das melhores performances orçamentais de há muito tempo.”