Parte do mercado laboral português já é menos rígido do que o alemão, francês ou holandês, mas OCDE quer mais. Já nos salários, nada deve mudar, muito menos no SMN
Salários de terceiro mundo, leis e preços de primeiro mundo. Parece ser este o único caminho que as instituições internacionais conseguem vislumbrar para Portugal. Ontem foi a vez de a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) apresentar um novo relatório a defender isto mesmo, desta feita a pedido do governo.
O estudo ontem publicado pela OCDE foi pedido por Passos e Portas para terem o carimbo desta instituição nas reformas que o governo levou a cabo. A OCDE respeitou o pedido e validou as reformas feitas pelo dueto governativo. “As reformas recentes colocaram o nível de protecção ao emprego dos contratos de trabalho permanente e temporário em Portugal mais próximo da média da OCDE e deverão ajudar a reduzir a segmentação do mercado de trabalho e a promover o crescimento da produtividade”, conclui a OCDE. O estudo dá uma enorme ênfase à questão do mercado laboral onde, mesmo já sendo menos rígido em alguns sectores do que aquilo que se encontra na Alemanha ou França – especialmente no que toca a despedimentos individuais ou colectivos de trabalhadores permanentes -, a organização pede ainda mais desregulação através de mais facilitação nos despedimentos. Contudo, a mesma OCDE ignora a questão salarial portuguesa – ainda no pré-crise, o trabalho dos residentes em Portugal era remunerado 50% abaixo da média da UE.
Apesar de a OCDE comparar Portugal em todos os indicadores com os restantes membros, nos salários, incluindo o salário mínimo, os valores portugueses não surgem comparados com nenhuns outros, não ficando patentes no relatório pedido pelo PSD/CDS as desigualdades salariais que existem entre Portugal e o resto das economias europeias e da OCDE. Mas apesar de este ser o único ponto em que a organização não recorre a comparações, a OCDE não deixa de dizer que “se recomenda que as autoridades mantenham o valor do salário mínimo inalterado até que existam sinais claros de recuperação do mercado de trabalho”.
Segundo Angel Gurría, “só é possível aumentar os salários se houver um aumento de produtividade”, disse o secretário–geral da OCDE depois de almoçar ontem com Passos. Gurría, convém relembrar, no tempo do governo de Sócrates, foi bastante criticado pelo PSD, precisamente por estes relatórios e/ou intervenções a pedido. “Angel Gurría fez um péssimo serviço à OCDE”, realizando “números políticos” para defender as políticas de Sócrates, criticava Nogueira Leite, da Comissão Nacional do PSD, em Setembro de 2010. Na altura, Gurría pedia “consenso” em torno das reformas de Sócrates para consolidar contas. Agora, Gurría já é amigo e o PSD só pede consensos.
in: Jornal i, 9 Julho 2014