Recensão ao livro “Alexander the Great: From His Death to the Present Day”, de John Boardman. Recensão publicada no nº 32 (2023) da revista “Cadmo – Revista de História Antiga”, do Centro de História da Universidade de Lisboa.

O aviso é dado pelo autor logo no início: este não é um livro sobre a história de Alexandre, mas antes uma obra “almost wholly concerned with stories told about him after his death”, ou seja, “the fantasy that scholars and poets have woven around him from antiquity down to present day” (p.1) e, como tal, “devoted to a selection of the stories about Alexander that were invented and circulated after his death, and to the ways he has been treated by authors and artists ever since”.
De autoria de John Boardman, Professor Emérito de Arqueologia Clássica de Oxford, e uma das maiores autoridades em Arte Clássica, não estamos perante um livro que pretenda ser uma biografia de Alexandre, o Grande, mas antes de um apanhado – “personal and not quite random” – sobre os múltiplos aproveitamentos, embelezamentos, exageros e liberdades criativas que ao longo dos séculos o Macedónio foi motivando. Boardman, que foi homenageado em Portugal em 2017 com um congresso internacional para assinalar o seu 90o aniversário, recorre a vários vestígios artísticos e numismáticos, mas não só, para se concentrar na “fantasia alexandrina” (expressão nossa), e de como esta se foi transfigurando através dos tempos e das geografias, não enveredando, portanto,
na tentativa de reconstruir o lado “histórico” de Alexandre. Esta é uma dicotomia que costuma ser constante nas obras sobre Alexandre, divididas entre a “realidade” e a “fantasia”, mas desta feita o foco está sobretudo na “fantasia”.
De facto, em termos de reconstrução histórica, a demanda de Alexandre é difícil de fazer quando se procura ir além de uma ideia genérica do seu périplo. Apesar de ter sido acompanhado por Calístenes de Olinto, por exemplo, que registou a viagem do Macedónio – enquanto viveu –, as narrativas que hoje temos sobre as conquistas de Alexandre foram escritas três ou mais séculos depois, por Diodoro da Sicília, Plutarco ou Arriano de Nicomédia. Mas, e apesar de baseadas parcialmente em textos originais, ou em excertos desses, nos séculos entre a data dos eventos e o seu registo por estes autores, a lenda, histórias e as historietas sobre a epopeia que criaria, em pouco mais de dez anos, o maior “império” até então – que teve tanto de grandeza militar como de reduzida longevidade –, ganharam diferentes roupagens, umas dificilmente confirmáveis, outras inquestionavelmente do reino do fantástico. Além disso, falando nós de autores já do período romano, há também que considerar a vocação propagandística de alguns destes textos…
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