Miguel Tamen apontou ao Os Fazedores de Letras que a redução das propinas poderá ter impacto nos investimentos a médio-prazo na melhoria da Faculdade e que este corte representa 25% das receitas da FLUL com propinas das licenciaturas.
In: Jornal da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa – Fevereiro, 2019
A redução do tecto máximo das propinas de 1.068 € para 856 € irá ter um impacto de 800 mil euros anuais nas contas da Faculdade de Letras, segundo afirmou Miguel Tamen, Director da FLUL, ao OFL.
«O impacto será de cerca de 800.000 € por ano. Afectará em cerca de 25% as receitas das propinas de 1º ciclo; e em quase 4% as nossas receitas totais», referiu o Director da Faculdade depois de questionado pelo OFL sobre os impactos da decisão, que entrará em vigor no próximo ano lectivo. E se os investimentos mais imediatos não serão afectados, o mesmo não se poderá dizer dos que estão pensados a médio-prazo.
«Como os investimentos para melhorias são pensados com maior antecedência, as consequências nestes serão a médio-prazo», detalhou sobre as repercussões que a quebra de receitas poderá ter nas tão necessárias obras de melhoria da FLUL.
Estas consequências, porém, só serão sentidas caso não haja uma compensação vinda do Orçamento do Estado para reforçar as verbas disponíveis para o Ensino Superior. Mas até ao final do ano passado, nada se sabia sobre isto. «Conhecem-se apenas promessas genéricas de compensação: mas, que eu saiba, ainda não se falou de números concretos», revelou Miguel Tamen ao OFL, em Dezembro.
A decisão relativa às propinas afecta apenas o valor pago pelos alunos de licenciatura, não sendo ainda certo o que acontecerá aos valores cobrados aos alunos de mestrados e doutoramentos, que são fixados pelo Conselho Geral da Universidade de Lisboa. A quebra nas receitas próprias das instituições ao nível das licenciaturas poderá, no entanto, passar factura aos seus alunos de segundo e terceiro ciclo, caso o Conselho Geral pretenda compensar de alguma forma a quebra de receitas com propinas dos alunos em Licenciatura.
Mesmo com descida, portugueses estão entre os que mais pagam
Segundo o Orçamento do Estado para 2019, entregue em Outubro no Parlamento, a propina vai descer 212 euros no próximo ano lectivo, um corte que, todavia, nem sequer melhora a posição relativa dos estudantes em Portugal face aos seus «rivais» de outros países europeus.
Segundo o sétimo relatório anual da rede Eurydice (National Student Fee and Support Systems in European Higher Education), divulgado em Novembro último, os estudantes em Portugal são dos que mais pagam pelo Ensino Superior, sendo que na Grécia, Turquia, Áustria, Dinamarca, Noruega, Escócia e Finlândia, não existem propinas e, na Alemanha, por exemplo, estas não ultrapassam os 100 euros anuais. Ou seja, mesmo em países onde o poder de compra das famílias é superior ao português, o custo de frequentar o Ensino Superior é mais baixo.
Propinas em atraso
A redução do tecto máximo, porém, poderá contribuir para que menos alunos caiam em incumprimento em relação a estes pagamentos, intensificando a recente tendência de melhoria neste campo.
Segundo números avançados pelo Director da Faculdade de Letras ao nosso jornal, o total de alunos da FLUL com propinas em atraso (há mais de 360 dias) subiu consideravelmente nos anos de 2015/16 e 2016/17, depois de estar em melhoria desde 2011. Nessa altura, havia menos de 400 estudantes, «ou seja, sensivelmente 10% dos nossos alunos», com dívidas há mais de 360 dias. Já no corrente ano lectivo, o cenário está a melhorar.
Já no ano 2017/18, os atrasos «voltaram a descer, embora para níveis superiores aos de 2011», continuou Miguel Tamen, que crê ser previsível que «os números para esse ano lectivo desçam mais um pouco», ainda que não tenham sido apurados dados finais. Segundo o Director da FLUL, do universo de alunos com propinas em atraso, a «grande maioria» regulariza a sua situação sem ultrapassar os 180 dias de atraso.
Autonomia? Onde?
O director da FLUL aproveitou as questões lançadas pelo OFL sobre a redução das propinas para abordar a questão da autonomia das faculdades, já que, diz, só com receitas próprias significativas é que estas instituições podem ambicionar ser verdadeiramente autónomas. Contudo, e apesar do valor cobrado aos alunos estar a ser aumentado quase incessantemente desde 1996/97, a autonomia das universidades não tem sido alargada.
«Em Portugal, as receitas próprias, nomeadamente através de propinas, são a única possibilidade realista de solução para a autonomia das universidades, embora a diminuição da dotação pública não tenha até aqui sido acompanhada de um aumento de autonomia», apontou o Director da FLUL. A seu entender, o problema reside na visão do país para o Ensino Superior.
«Suponho que o problema é haver mais gente atraída pela ideia de que as universidades devem servir objectivos nacionais do que pela ideia de que cada universidade deve poder decidir quais são os seus objectivos», rematou.