O grande problema da Europa é há anos só aparecer como sonho a alguns não eleitos – que depois acordam e fazem tudo acontecer à revelia de milhões de europeus. Aderir à CEE? Aprovado. Moeda única? Aprovado. Absorver mais 12 países em três anos só para abrirmos mais mercados depois de termos demorado 30 anos a chegar a 12 membros? Com certeza. Decidir o que todos comemos? Claro. Impingir o TGV sem haver ligações decentes para o Alentejo? Yes we can! Ratificar um tratado que 99% das pessoas desconhece só porque se chama “Lisboa”? Siga!
Ainda ontem Durão Barroso, eleito por meia dúzia, pediu um “novo momento federativo” para salvar o euro do buraco. Antes, Merkel e Sarkozy, eleitos por alemães e franceses, exigiram o mesmo: queremos controlar os orçamentos de todos os países, decidir o IVA e o IRS, onde investem e quanto gastam em apoios sociais ou em cultura – tudo apresentado ainda por cima em tom de ameaça: “Só acabamos com a crise se cederem soberania.”
Até percebo que se queira avançar para o federalismo, basta ver alguns orçamentos para ver que há países (nós, por exemplo) que só lá vão com trela. Agora daí a dar-se o passo sem sequer o discutir com os europeus – e ver o que está ou não em causa – é só o sintoma do pesadelo em que se transformou a Europa para os europeus. A dada altura decidiram que iam construí-la sem nos perguntar. E este avanço autista para o federalismo vai ser a estocada final. Basta ver: agora que é preciso que os europeus se identifiquem com o projecto para que se ajudem estamos de costas voltadas a pensar no umbigo. É que exigir a irmãos criados em casas separadas e que mal se cruzam o mesmo que se exige a irmãos que vivem juntos há mais de 15 anos é pouco razoável. Concordo com a UE e, provavelmente, com o federalismo. Só não o façam nas minhas costas. Que isso não admito.
in: Jornal i, 15 Setembro 2011
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